Encantos do Sul

Um quilombo autossuficiente e histórico para Santa Catarina

Garopaba abriga antiga comunidade, que resistiu ao preconceito e virou destino turístico

Por Thiago Hockmüller - thiago.hockmuller@engeplus.com.br

Em 28/09/2018 às 11:59

No alto do Morro do Fortunato, na comunidade de Macacu em Garopaba, existe um vilarejo autossuficiente e que abriga parte da história da cidade. História que remete ao período da escravidão, de negros que resistiram bravamente ao preconceito racial e hoje fazem valer o status do local como patrimônio histórico e cultural do município. 

Não é à toa que a comunidade quilombola do Morro do Fortunato faz parte da Associação Costa Catarina sendo considerada um importante destino turístico de Garopaba. Durante o passeio pela Rota da Baleia Franca, o Portal Engeplus pôde visitar o Morro do Fortunato e conhecer parte desta história. 



Receptivo, o casal Maurílio e Odete Machado é um dos mais antigos da comunidade. Respeitados e conhecedores da história local, contam com detalhes fatos marcantes em Garopaba. E claro, não poupam elogios ao pedaço de terra onde vivem.  “Aqui é tudo em família, uma comunidade só. Eu moro aqui desde que nasci, há 60 anos. Tenho cinco filhos e eles moram aqui. Aqui é uma paz, não tem lugar igual para morar. Não dá para comparar, um ajuda ao outro. Pra viver é uma maravilha. Aqui se planta e se colhe sem agrotóxico, tudo natural”, comenta Maurílio, que é casado há 36 anos com Odete. 

Gostamos da segurança. Se existir um roubo aqui é de alguém que veio de fora e roubou. Aqui tem uma regra, que é não mexer no que é dos outros

 Maurílio Machado, morador da comunidade quilombola do Morro do Fortunato

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Tudo começou com Fortunato Machado 

O Morro do Fortunato leva esse nome em função do bisavô de Maurílio, Fortunato Machado, que se estabeleceu ali logo após a abolição da escravidão assinada pela Princesa Isabel em 1888. Uma das hipóteses é que Fortunato comprou os 53 hectares de terras com o lucro de sua primeira safra de café. Uma outra narrativa conta que ele ganhou o espaço de presente porquê era muito querido pela família Pereira da Silva, uma das donas da propriedade, que o considerava educado e trabalhador. 

A grande verdade é que em pouco tempo ele construiu a sua casa, mas, segundo contam os seus descendentes, sempre preservando a natureza e cultivando vários tipos de frutas e legumes. Ali, Fortunato casou e morou com Luiza Cristina da Conceição, com quem teve oito filhos, sendo seis homens e duas mulheres. Depois casou novamente, mas não teve filhos.  

Os descendentes de Fortunato seguiram povoando o local. Conforme Maurílio, há 40 anos só tinha 15 famílias habitando o Morro do Fortunato. Hoje são 46, um total de 180 pessoas.  

Documentário produzido por Rita de Cácia Oenning da Silva e Kurt Shaw

Natureza preservada  

Fortunato faleceu em 1937. Mas deixou um legado de união para a comunidade. No quilombo todos se ajudam e se protegem. E protegem a natureza. Abaixo do morro, a Lagoa de Macacu serve como um importante local de pesca. Já no alto do morro a própria comunidade se autossustenta com a produção legumes e verduras orgânicas, que são comercializadas juntamente com doces caseiros. 

Recentemente o quilombo venceu licitações junto ao Governo Federal para fornecer biscoito e banana para o Instituto Federal de Santa Catarina (Ifsc) de São José.  

Vencendo o preconceito racial 

Conforme os guias turísticos de Garopaba, até a década de 90 ainda era possível observar fortes raízes do preconceito racial. Maurílio lembra com clareza dos problemas enfrentados pela comunidade. “A discriminação racial ainda existe bastante, só que está camuflada. Tem gente que se abraça, conversa, conta história, mas por dentro tem discriminação racial. Isso não deveria acontecer”, pondera.  

A própria consolidação da comunidade quilombola foi um reflexo da discriminação. Conforme relatos de moradores e guias turísticos, na década de 80 ainda era possível encontrar estabelecimentos com ambientes divididos afim de evitar a mistura entre negros e brancos. “Aqui era terrível. O Fortunato ganhou essa área, que são 53 hectares de terra. Ele veio para cá e aqui ele ficou. A família toda dele mora aqui. Era uma maneira de se isolar, porque sofremos muito lá em baixo”, conta Maurílio. 

Tinha família que quando ia para Garopaba e encontrasse um negro voltava. Há 45 anos tinha um salão aqui que negro usava um lado e branco usava o outro 

Maurílio Machado, morador da comunidade quilombola do Morro do Fortunato

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Hoje, reconhecida a importância do quilombo, já é possível encontrar na internet documentários que contam a história dos Fortunatos. A própria comunidade possui títulos que contextualizam a consolidação do quilombo, um deles é uma revista em quadrinhos que conta o passo a passo da história local. 

O Morro do Fortunato também é ponto de visitação para alunos de várias cidades catarinenses – em outubro uma turma de Blumenau visitará a comunidade. E também serve como ponto turístico em um roteiro de base comunitária, onde os turistas são convidados para um almoço com comidas típicas do quilombo.  

Conheça mais sobre a comunidade quilombola do Morro do Fortunato clicando aqui.

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