Mundo do Agronegócio

Milho na várzea e arroz na lomba, assim plantavam nossos avós.

Por Silmar Vieira - mundodoagronegocio@engeplus.com.br

Em 14/03/2023 às 19:39

Se pudéssemos perguntar aos nossos avós ou bisavós qual o melhor terreno para cada tipo de plantio, com toda certeza ouviríamos que arroz se planta nas melhores lombas e que não há melhor lugar para se plantar milho que nas “vergens” gordas dos rios. Para quem não é do meio rural, deve estar achando estranho esse papo, afinal não vai conseguir concluir que hoje em dia se faz justamente o contrário. Se você for perguntar a um jovem agricultor, ouviria exatamente o contrário, de que arroz se planta nas várzeas, que são os terrenos mais baixos e alagadiços e que o milho é uma cultura mais propícia a ser implantada em terrenos mais altos e sem riscos de alagamentos.

O interessante é que ambos estão certos, claro que cada um ao seu tempo ao seu modo.

Uma das primeiras grandes dificuldades que os colonos europeus tiveram ao chegar ao Brasil, foi adaptar-se às culturas locais descobrindo o que, quando e como cultivar. Contando muitas vezes apenas com dicas de moradores mais antigos, ou muitas vezes dos próprios índios, foram descobrindo os segredos de uma agricultura que era totalmente diferente da que conheciam em seus países de origem. Eles não dominavam dois fatores fundamentais da agricultura que são tipo de solo e o clima da região, sem contar outro fator crucial, que é a variedade de sementes a ser utilizada.

Assim, por tentativa e erro, que lhes custou muito dinheiro, trabalho e até fome em muitos casos, eles foram aprendendo a lidar com estas variáveis, adaptando sua alimentação aos produtos nativos que eram mais produtivos e que tinham melhores chances de vingar.

Porém, alguns produtos eram cruciais na questão da alimentação não apenas da própria família, que era a prioridade dos colonos, mas como também na alimentação de animais, que por sua vez também eram cruciais na obtenção da proteína como carne e leite, além da própria força de tração no trabalho e no transporte. Milho e arroz tinham uma importância vital nesse processo produtivo e na garantia da subsistência das famílias.

Vale lembrar que eram outros tempos e que as variedades de milho e arroz existentes tinham adaptações genéticas diferentes, sem contar a ausência total de defensivos ou fertilizantes químicos. Isso significa que restava fazer muito pouco caso surgisse uma praga e o máximo que se fazia em termos de fertilização era utilizar o esterco dos animais nas lavouras. Esse era um dos motivos de plantar o milho nas várzeas, uma vez que desde os antigos egípcios, que se valiam das cheias do Rio Nilo, as enchentes sempre foram fonte de nutrientes para o solo e sendo o milho mais exigente em termos de nutrição, a melhor estratégia era cultiva-lo nas áreas alagáveis, com solos mais férteis, apesar dos riscos das enchentes levarem a própria plantação.

Prova disso era o fato de ser comum a prática de comunidades ribeirinhas mais próximas da foz dos rios, se valerem das enchentes para recolher abóboras que desciam levadas pelas águas. Como era comum que se plantassem as abóboras em meio aos pés de milho, como forma de protegê-las do sol e garantir também terra mais fértil, essas eram colhidas muitas vezes pelo rio e não pelos agricultores.  

Em meados da década de 1980, um convenio entre o governo de Santa Catarina e a empresa alemã GTZ, começou a implantar aqui no estado o chamado “Projeto Pró-Várzeas”, que consistia em implementar técnicas trazidas dos campos de cultivo de arroz da Ásia. A percepção que se tinha era de que as terras do litoral catarinense eram compostas basicamente por planícies alagáveis, entre o mar e a Serra Geral aqui no Sul e a Serra do Mar no Norte. Este tipo de solo e sua topografia não favoreciam lavouras de lomba valorizadas na época como fumo, feijão e mandioca, mas se mostravam promissoras para a implantação do cultivo de arroz pré-germinado direto na água.

Com a coordenação do engenheiro agrônomo alemão, Ernest Lamster, e o apoio de todo corpo técnico da Empasc e Acaresc, empresas que deram origem à Epagri, o projeto foi tomando corpo em todo o litoral e aos poucos começaram a surgir as taipas de arroz irrigado como as conhecemos hoje. Apesar da resistência inicial dos produtores, uma vez que essas técnicas iam contra a tudo o que eles conheciam como lógico até então, o aumento de produção e produtividade foram aos poucos convencendo até os mais céticos. Só para ter uma ideia, no início da implantação do projeto a média de produtividade do arroz era de no máximo 30 sacas por hectare, enquanto que hoje a média de produtividade dificilmente baixa de 160 sacas por hectare, sendo comuns médias bem superiores a esta, podendo passar de 200 sacas por hectare.   

É bem verdade que a rizicultura vem passando por diversas crises nos últimos anos, mas ainda é a maior área plantada na nossa região e responsável pelo maior volume financeiro. Somente na safra passada o valor calculado pela Epagri é que a produção de arroz tenha movimentado mais de R$ 1,2 bilhão, considerando apenas a comercialização do produto, sem contar as movimentações com insumos, máquinas, equipamentos e empregos diretos e indiretos.

Hoje nos ressentimos da perda de áreas de milho uma vez que, convertidas para o cultivo de arroz, as terras não mais podem voltar a produzir o milho, cereal que hoje está com valor agregado bem mais atrativo. É certo, porém, que é preciso estar atento às mudanças, como a que aconteceu na década de 1980, que foi traumática e radical, mas que trouxe muitas décadas de bons frutos. Talvez estejamos próximo de uma nova grande mudança cultural e estrutural e por isso vale a pena estar sempre atento às lições do passado e aos desafios do futuro.       

 

  

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