Por Lucas Renan Domingos -
Em 19/06/2024 às 16:50Está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1904/2024, chamado de “PL do aborto”. O texto de autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, inclusive nos casos de gravidez resultante de estupro.
Atualmente, o aborto no Brasil é legalizado em três situações. Duas delas estão previstas no Código Penal, que permite o procedimento em casos de gravidez resultante de estupro e quando existe risco para a vida da mãe. Já em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o aborto também é permitido na existência de anencefalia (má formação do cerebral do feto, impossibilitando a vida do bebê após o nascimento).
O Código Penal estipula ainda penas para a prática de abortos não legalizados no país. Caso seja praticado pela gestante, a lei prevê de um a três anos de detenção. Se o procedimento for realizado por terceiros a pena é de um a quatro anos de prisão nos casos em que houve consentimento da gestante ou de três a dez anos sem o consentimento.
O advogado criminalista Leandro da Rosa explica que, se aprovado, o “PL do aborto” prevê aumento de pena em todos os casos de aborto, seja ele legal ou ilegal, quando ultrapassado o período de 22 semanas de gestação. A punição seria de 6 a 20 anos de detenção, a mesma aplicada para crimes de homicídio simples.
“O projeto de lei busca firmar um marco temporal para que esta gestante procure um médico ou hospital para fazer este aborto [nos casos legais]. Se ultrapassar estas 22 semanas, o projeto de lei busca que por ‘essa demora’, a mãe responderá por crime de homicídio simples, podendo ser qualificado, dependendo do caso”, explicou.
Nas condições em que o Código Penal já determina o aborto como crime, a pena seria também equiparada ao homicídio. “Se um aborto ocorrer antes do período de 22 semanas, daí aplica-se a lei atual”, acrescentou Rosa.
Nos casos onde a mãe pratica o autoaborto, o PL acrescenta que "o juíz poderá mitigar a pena, conforme o exigirem as circunstâncias individuais de cada caso, ou poderá até mesmo deixar de aplicá-la, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária".
O período depois da 22ª semana é considerado o de “viabilidade fetal” que é quando, apesar a prematuridade, o bebê ainda teria condições de viver fora do útero.
O que defende o projeto de lei
Na justificativa do projeto, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) argumenta que, quando o Código Penal foi promulgado, “se o legislador não colocou limites gestacionais ao aborto, não foi porque teria querido estender a prática até o nono mês da gestação”.
Sóstenes Cavalcante, autor do PL 1904/2024 - Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
“Em 1940, quando foi promulgado o Código Penal, um aborto de último trimestre era uma realidade impensável e, se fosse possível, ninguém o chamaria de aborto, mas de homicídio ou infanticídio”, destaca o texto.
“Como o Código Penal não estabelece limites máximos de idade gestacional para a realização da interrupção da gestação, o aborto poderia ser praticado em qualquer idade gestacional, mesmo quando o nascituro já seja viável”, acrescenta a defesa.
Além do autor da proposta, outros 32 parlamentares assinam o PL como coautores, entre eles estão os deputados federais catarinenses Júlia Zanatta (PL) e Rafael Pezenti (MDB).
O que dizem os contrários ao projeto
O avanço do projeto na Câmara de Deputados gerou protestos contrários à proposta em várias partes do Brasil. Em Criciúma, na noite dessa terça-feira, dia 19, um grupo de pessoas se reuniu na Praça Nereu Ramos para demonstrar descontentamento ao “PL do aborto”.
Os críticos do projeto de lei afirmam que, caso o texto seja aprovado, a vítima de estupro, por exemplo, teria pena maior do que o estuprador. O Código Penal aponta que estupradores podem ser punidos com prisão de 6 a 12 anos, podendo chegar a 15 anos caso a vítima seja menor de 14 anos.
Protesto na Praça Nereu Ramos - Foto: Giovane Marcelino/Especial Portal Engeplus
“O que motivou a gente a protestar foi o projeto de lei equiparar o aborto ao crime de homicídio. Esta equiparação, para nós, é um fator que resume o nosso protesto. As penas são maiores do que o crime de estupro. É dar uma carta branca para o estuprador”, aponta Sabrina Pereira, uma das organizadoras do protesto em Criciúma.
Outro argumento usado pelos contrários ao PL é de que a lei retrocede direitos das mulheres. “Não queremos que retroceda os nossos direitos. O aborto legal já é previsto em lei desde a década de 40”, enfatizou Sabrina.
Os críticos ainda defendem que o prazo de 22 semanas pode prejudicar principalmente as vítimas adolescentes, que demoram a entender as mudanças do seu corpo e perceberem uma gravidez. Os contrários ao PL argumentam também que na maioria das vezes os crimes de estupro são cometidos por pessoas próximas das vítimas, o que lhes causam insegurança para denunciar ou procurar ajuda.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado em 2023 mostrou que em 2022 pelo menos 61,3% dos estupros registrados no país foram cometidos contra meninas menores de 13 anos. Adolescentes a partir de 12 anos que cometem aborto ilegal respondem por ato infracional.
Tramitação
No dia 12 de julho, a Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência do PL 1904/2024. Desta forma, o texto não precisa passar pelas comissões e pode ser analisado e votado direto no plenário a qualquer momento. Se aprovado, segue para avaliação do Senado e depois para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Caso Lula vete o projeto, o Congresso Nacional pode derrubar o veto.
Mas nessa terça-feira, o presidente da Câmara dos Deputados, o deputado federal Arthu Lira (PP-AL) afirmou que o projeto deverá ser votado somente após o recesso da casa, no mês de julho. Ele também confirmou que uma comissão com representantes de todos os partidos será criada para debater o "PL do aborto".
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