Por Rafaela Custódio -
Em 16/02/2024 às 10:30Sair para trabalhar sem saber o que vai acontecer ao longo da jornada. Chegar ao seu posto de trabalho sem saber que horas o telefone vai tocar e se ele vai chamar. Quem precisará da sua atenção? Quem necessitará do seu profissionalismo? Quantas pessoas precisarão dos seus serviços? Essas perguntas só serão respondidas pelos profissionais de saúde que atuam no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) após 12 horas seguidas de trabalho.
Em Criciúma, o Samu completa 18 anos de existência nesta sexta-feira, dia 16 de fevereiro. São quase duas décadas de dedicação aos moradores, um cuidado que não mede esforços, cansaço ou qualquer outra dificuldade que possa ocorrer ao longo do plantão. A missão dos profissionais é apenas uma: socorrer com a missão de ajudar, independente de raça, cor, religião, dinheiro ou qualquer desafio.
A reportagem do Portal Engeplus acompanhou uma equipe do Samu de Criciúma por 12 horas e conta a partir de agora a rotina, a correria do dia a dia, a missão e a história de pessoas por trás de uma farda azul.
Mas afinal, o que é e para que serve o Samu?
O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) presta atendimento de saúde e conta com equipes de médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e socorristas. O serviço prestado ocorre no menor tempo-resposta possível – com a garantia do acesso do paciente à Unidade de Saúde mais adequada.
O atendimento do Samu começa a partir do chamado telefônico 192, quando são dadas as orientações sobre as primeiras ações. A ligação é gratuita e funciona durante 24 horas, todos os dias da semana, para telefones fixos e móveis. Os técnicos do atendimento identificam a emergência e coletam as primeiras informações sobre os pacientes e sua localização.
Legenda: ambulância do Samu em atendimento - Foto: Thiago Hockmüller/Arquivo/Portal Engeplus
Criciúma teve papel precursor na história do serviço
Antes de ser criado o Samu no Brasil, Criciúma possuía, na década de 90, o Disque 192, que acabou servindo de exemplo para todo o país. “A saúde pública na década de 90 teve uma série de serviços em Criciúma que se tornaram referência para o Brasil, uma delas é o Samu. Nós não tínhamos como chamar um atendimento 24 horas para atender um paciente à noite, aos fins de semana ou pessoas que precisavam de um atendimento mais de urgência. Então, na década de 90 nós criamos o Disque 192, em parceria com o Corpo de Bombeiros. A partir disso, começamos a trabalhar com uma ambulância 24 horas para socorrer as pessoas quando os bombeiros não conseguiam. Isso foi o início de um processo para instalar o Samu no país e, claro, anos depois em Criciúma”, explica o secretário de Saúde de Criciúma, Acélio Casagrande.
Casagrande recorda que uma comitiva veio da França conhecer o sistema do Disque 192. “O Ministério da Saúde começou a trabalhar na formação do Samu em todo o país. Então, a partir daqui de Criciúma nasceu esse sistema que é uma referência para o mundo”, reforça.
O secretário municipal de Saúde ressalta que apesar de rápido, os profissionais que atuam no Samu precisam trabalhar de forma humanizada. “Precisamos de um atendimento capacitado, humanizado e aliado à tecnologia e aos avanços que estamos tendo. Com as demandas e a população crescendo, o Serviço Aeromédico do Sul de Santa Catarina (Sarasul) foi criado. Nos próximos meses, teremos as motolâncias, que virão para ajudar”, comenta. “Há uma evolução não só tecnológica, mas também de usar a inteligência para poder chegar em determinados locais. Salvar uma vida é questão de segundos e sempre buscamos alternativas de atendimento rápido”, completa.
Até que chegue ao paciente, o atendimento do Samu passa por uma série de etapas
O Samu possui algumas etapas até a chegada dos profissionais de saúde no atendimento ao paciente. Confira abaixo os serviços:
A Central de Regulação das Urgências (CRU) é o lugar onde chegam todos os chamados de urgência e emergência da população que liga para o telefone 192. A CRU conta com uma estrutura organizacional constituída por profissionais capacitados em regulação dos chamados telefônicos, que demandam orientação por meio da classificação e priorização das necessidades de assistência em urgência. Em Santa Catarina, o Samu conta com oito CRU’s, uma em cada mesorregião do Estado: Grande Florianópolis, Norte/Nordeste, Sul, Vale do Rio Itajaí, Foz do Rio Itajaí, Planalto Serrano, Meio-oeste e Extremo Oeste.
As Centrais de Regulação têm um papel muito importante para o resultado efetivo do atendimento à pessoa que está em situação de urgência em saúde. No caso de envio de uma ambulância para prestar o socorro, a CRU acompanhará o atendimento até seu término, apoiando as equipes quando necessário e preparando a recepção adequada do paciente no hospital ou em outra instituição de saúde ou até mesmo na própria residência, uma vez que todo processo de regulação e atendimento no local são executados por profissionais de Saúde.
As Unidades Móveis são as ambulâncias do Samu que ajudam a transportar pacientes de forma segura e eficiente para Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e hospitais (públicos ou privados). Esse transporte é estruturado com os mais modernos equipamentos médicos e tecnologia para garantir que os pacientes recebam o melhor atendimento durante o trajeto. Existem dois tipos de ambulâncias: a Unidade de Suporte Básico (USB) e a Unidade de Suporte Avançado (USA). As Unidades de Suporte Básico (USB) atendem casos de menor complexidade e contam com equipamento básico de suporte à vida. Neste caso, a equipe é formada por condutor socorrista e técnico de enfermagem.
Já as Unidades de Suporte Avançado (USA) são equipadas com aparelhos e equipamentos semelhantes aos da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e têm sua equipe formada por condutor socorrista, médico e enfermeiro.
Para dar suporte à equipe terrestre, o Samu conta com unidades de suporte avançado aéreas (helicópteros e aviões), em parceria com o Corpo de Bombeiros Militar. Essas unidades são utilizadas em casos de atendimento de difícil acesso ou necessidade de remoção rápida ou de longa distância. As equipes das aeronaves são compostas por médicos e enfermeiros do Samu, além da tripulação do Corpo de Bombeiros. Em Santa Catarina existem 26 USAs, 95 USBs, dois helicópteros (asa rotativa), e duas aeronaves asa fixa.
Arte: Portal Engeplus
Quando devo chamar o Samu?
Ao ligar para o Samu, esteja atento a essas dicas:
Conforme o Ministério da Saúde, existem casos em que não se deve chamar o Samu, como por exemplo:
Importante: Nestes casos e em todos sem caracterização de urgência ou emergência, o paciente poderá ser encaminhado ao posto de saúde ou então as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) mais próximas.
Samu surgiu no Brasil em 2003 com objetivo de responder de forma adequada às necessidades de atendimento
No Brasil, o Samu iniciou por um acordo bilateral, assinado entre o Brasil e a França, através de uma solicitação do Ministério da Saúde. Foi criado em 2003 e oficializado pelo Ministério da Saúde por meio do Decreto nº. 5.055, de 27 de abril de 2004. Hoje, a portaria Nº 1.010, de 21 de maio de 2012, redefine as diretrizes para a implantação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e sua Central de Regulação das Urgências (CRU), componente da Rede de Atenção às Urgências.
A função básica de um Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) é responder de forma organizada, a fim de evitar o uso excessivo de recursos, a toda situação de urgência que necessite de meios médicos, desde o primeiro contato telefônico até a liberação das vítimas ou seus encaminhamentos aos serviços de saúde. O sistema deve determinar e desencadear a resposta mais adequada para o caso, assegurar a disponibilidade dos meios hospitalares, determinar o tipo de transporte exigido e preparar o acolhimento dos pacientes nos serviços de saúde.
Em Criciúma, serviço conta com dois postos para rápido atendimento
Atualmente, o Samu de Criciúma é administrado pelo Instituto Maria Schmitt (IMAS) e possui dois postos, sendo um no distrito do Rio Maina e outro no bairro Próspera. O objetivo é que o atendimento seja mais rápido.
Em média, os profissionais do Samu de Criciúma levam 12 minutos para chegar a um atendimento, mas esse tempo pode diminuir ou até mesmo aumentar dependendo da distância, horário e, claro, trânsito até o endereço do paciente.
Criciúma registrou 6.742 atendimentos em 2023, sendo que 3.553 foram realizados pela equipe do posto do bairro Próspera e 3.189 pelos profissionais do Rio Maina. Já em janeiro, Criciúma registrou 611 atendimentos feitos pelo Samu. Hoje, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência de Criciúma possui 22 funcionários entre técnico de enfermagem, condutor socorrista, farmacêutico, enfermeiro e auxiliar de serviços gerais.
O Samu de Criciúma é administrado pelo IMAS há sete meses, para um contrato de um ano. Atualmente, são repassados à empresa cerca de R$ 130 mil pela Prefeitura de Criciúma. “O Samu de Criciúma atua com Unidades de Suporte Básico (USBs). Em média, temos entre 580 e 620 atendimentos mensais na cidade. O comprometimento com a qualidade, desde o uniforme do profissional, as condições das viaturas, até o atendimento, tudo é cobrado para que seja de excelência. Todos os nossos funcionários atuam na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)”, explica o diretor do IMAS, Fabiano Ribeiro.
Conforme Ribeiro, o Samu de Criciúma é uma referência no Estado. “Atendemos de acordo com a demanda e somos deslocados para Forquilhinha, Siderópolis e até mesmo para Balneário Rincão, dependendo da ocorrência e da necessidade”, detalha.
Ribeiro explica que os profissionais do Samu seguem uma regulamentação, ou seja, eles não tomam decisões sozinhos e seguem um planejamento. “Nosso tempo resposta é de 12 minutos em 75% das ocorrências. Não temos autonomia para levar o paciente para onde o técnico de enfermagem achar melhor, isso porque quem decide para onde o paciente vai é o médico regulador. O técnico de enfermagem possui os olhos, ouvidos e descreve exatamente o que ele está atendendo no paciente para o médico regulador e o médico decidirá para onde destinar, seja Hospital São José ou UPA, por exemplo”, comenta.
Legenda: diretor do IMAS, Fabiano Ribeiro - Foto: Rafaela Custódio/Portal Engeplus
15 anos de trabalho prestados ao Samu
A técnica de enfermagem, Cristiane da Luz, de 42 anos, atuou por 15 anos no Samu de Criciúma. Atualmente, ela trabalha na urgência-emergência na Prefeitura de Criciúma. Por mais de uma década, ela viveu a adrenalina de plantões corridos, ajudar o próximo e salvar vidas. “Eu fazia curso técnico de enfermagem no Hospital São José e tinha uma entrega de materiais para o Samu que me chamou atenção. Fiz vários cursos e me capacitei para conseguir a vaga”, recorda.
Durante os 15 anos de atividade, Cristiane atendeu diversas ocorrências que a marcaram de alguma forma. “Um acidente trágico na BR-101, infelizmente, me marcou muito nesse período. Era um feriado de Páscoa e uma colisão frontal deixou cinco mortos, todos do mesmo carro. Quando os militares do Corpo de Bombeiros abriram o carro com as vítimas, havia uma criança segurando um ovo de Páscoa. Isso foi muito triste e a cena ficou na minha memória para sempre”, lamenta.
A técnica de enfermagem realizou nove partos durante seus 15 anos de Samu. “É sempre uma alegria trazer ao mundo uma nova vida. Foram nove partos e essas, com certeza, também são lembranças que levarei na vida”, destaca. “Nunca nenhum paciente que entrou na minha ambulância com vida, mesmo gravemente ferido, morreu", completa.
Na manhã do dia 1° de fevereiro de 2016, um assalto em uma agência bancária do bairro Pinheirinho, em Criciúma, mobilizou as forças de segurança. Um policial militar, que estava de folga, trabalhava como segurança particular de um supermercado e transferia o malote junto de outro funcionário até a agência bancária. Os assaltantes mandaram que ele ajoelhasse e atiraram. Cristiane estava de plantão e o Samu foi acionado. “Em poucos minutos chegamos ao local. Conseguimos atender o policial que estava ferido, trouxemos ele para a ambulância, levamos para o Hospital São José, ele passou por cirurgia e ficou bem. Foi uma ocorrência que chamou atenção, pois quando saímos da base não sabíamos que era um policial militar ferido”, conta.
‘A adrenalina da urgência e emergência é diferente’
Com 15 anos de experiência no Samu, Cristiane garante que o serviço é diferente e o profissional precisa se doar. “A adrenalina da urgência e emergência é diferente. É algo que marca o profissional e não é para qualquer um. Você precisa se doar 100%. Por mais que você tenha um médico regulador para te auxiliar por telefone, são seus olhos, a sua atenção, os teus cuidados, é você que está com o paciente. É diferente”, frisa.
Avanços do Samu
A técnica de enfermagem garante que o Samu evoluiu muito nos últimos anos. “Quando comecei a trabalhar não tínhamos Google Maps, nós usávamos um mapa de papel e, claro, com a experiência e conhecimento do condutor socorrista chegávamos ao destino. Na primeira ambulância não tínhamos ar condicionado, era tudo diferente. Hoje, avançamos muito e temos os melhores equipamentos nas ambulâncias em Criciúma. Assim como as equipes também evoluíram. O que sempre me cobrei é para que eu pudesse me doar 100% ao trabalho. Uma vida não tem preço e nunca terá, precisamos estar focados no serviço, no atendimento e dar o melhor todos os dias”, destaca. "Durante os 15 anos de trabalho no Samu realizei diversos cursos, como em São Paulo e Brasília. O objetivo sempre foi me capacitar para ajudar a sociedade", completa.
Profissionais que atuam hoje no Samu de Criciúma
A reportagem do Portal Engeplus acompanhou um plantão de três profissionais da saúde e contamos, a partir de agora, quem são essas pessoas, que deixam suas famílias em casa para ajudar o próximo.
Carulini Francisco Barbosa, de 31 anos. é técnica em enfermagem há 11 anos. Natural de Içara, ela trabalha no Samu há quatro. “Acho que a enfermagem é uma profissão que é para poucos e tem que ter o dom. Mas a enfermagem me despertou na questão de querer ajudar o próximo e o mundo do Atendimento Pré-Hospitalar foi uma coisa que veio consequentemente. Trabalho há 11 anos no Hospital São José também, local em que me formei como técnica de enfermagem”, conta.
Ela trabalha 24 horas seguidas, sendo 12 no Hospital São José à noite e durante o dia no Samu. Isso não acontece todos os dias mas, sim, em uma escala 12 por 36. “No hospital trabalho na sala de emergência, que é a sequência do meu atendimento pré-hospitalar do Samu. Atendo na rua, hoje com o Samu, faço todo o atendimento pré-hospitalar e encaminho o paciente, quando necessário, ao hospital. Então, meus dois trabalhos estão conectados”, observa.
Como surgiu a vontade de atuar com saúde?
Caru, como Caruline é carinhosamente conhecida, relata que seu avô Valmir Francisco era acamado e ela presenciou o trabalho que sua avó Ondina Sebastião passava. “Aquilo me despertou o querer cuidar, ajudar o próximo. O Atendimento Pré-Hospitalar, na verdade, surgiu por trabalhar na emergência. O serviço intra-hospitalar é bem diferente do pré-hospitalar. A enfermagem é uma continuidade, o serviço de urgência e emergência tem uma continuidade. O Samu foi um presente de Deus e da técnica de enfermagem, Cristiane da Luz, que fez a entrevista e todo o processo da minha contratação. O Samu é um trabalho viciante e gratificante”, garante.
“Quando meu telefone toca, nunca sei se é minha mãe, meu marido, minha filha ou uma ocorrência. É uma caixinha de surpresa e, por isso, temos que estar preparados durante todo o plantão”.
Carulini Francisco Barbosa, técnica de enfermagem.
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Além da técnica de enfermagem, na ambulância também está o condutor socorrista Donny Fonseca Nunes, que é responsável por dirigir e ajudar durante o atendimento. “Temos que ter um entrosamento, uma sintonia. Muitas vezes com apenas um olhar conseguimos nos comunicar”, destaca. “Um trauma nunca é igual ao outro, nunca teremos um atendimento igual, cada um é particular e, por isso, os profissionais precisam ter sintonia e estar alinhados”, completa.
Legenda: Carulini e Donny atuam juntos nos plantões - Foto: Rafaela Custódio/Portal Engeplus
“Venho disposta a enfrentar qualquer coisa”
Após trabalhar 12 horas no Hospital São José, Caru chegou ao posto do Samu no bairro Próspera disposta e não aparentou em nenhum momento ao longo do plantão estar cansada. “Já atuo há quatro anos nos dois empregos e já estou acostumada. Mas cada plantão no Samu é único. O paciente é diferente, a idade é diferente, a queixa é diferente. Então é realmente uma caixinha de surpresas. Eu venho disposta a enfrentar qualquer coisa, mas o que vou enfrentar? Não sei, vou descobrir ao longo das 12 horas”, afirma.
Família e trabalho
A técnica de enfermagem trabalha por 24 horas e depois tem folga por outras 24 horas. No tempo livre, está em casa com a filha Bianca, de 8 anos, e o marido Maicon Teixeira. “Minha filha fica com a minha mãe Vanilda Francisco e tenho uma rede de apoio muito grande, isso me ajuda muito também. A vida é feita de metas e tenho dois empregos por causa disso. Quero conquistar meus objetivos e sigo trabalhando”, reforça. “Ao longo desses cinco anos fiquei doente, emagreci, perdi cabelo. Nem tudo é perfeito e temos que reconhecer. Mas é um trabalho viciante, estar na enfermagem é viciante”, completa.
Carulini comenta que a filha também é apaixonada pelo Samu. “Ela conta na escola que a mãe trabalha no Samu. A Bianca sempre diz que quer trabalhar no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência e isso é um orgulho, mostra que ela tem orgulho da mãe dela”, observa.
Legenda: Carulini ao lado da ambulância em que trabalha - Foto: Rafaela Custódio/Portal Engeplus
Passado e futuro
Há 12 anos, quando iniciou o curso de técnica de enfermagem, ela não imaginou que teria a carreira que tem hoje. “Me imaginava trabalhando no hospital, mas depois do estágio me encontrei na emergência hospitalar e isso foi minha escola para o Samu. Digo que o Hospital São José é uma eterna escola, pois aprendemos diariamente”, frisa. A profissional também está cursando Enfermagem. “Hoje, minha meta de vida é me formar e atuar como enfermeira em uma Unidade de Suporte Avançado (USA) do Samu. Esse é meu objetivo para os próximos cinco anos”, ressalta.
Sonho
O sonho da carreira da técnica de enfermagem é realizar um parto dentro da ambulância. “No hospital já fiz parto, mas dentro da ambulância será único. Se um dia eu atender uma ocorrência de parto e o bebê nascer dentro da ambulância, estarei realizada”, reitera.
15 anos de dedicação ao Samu
O enfermeiro Magdiel Galvão Domingues, de 39 anos, está há 15 trabalhando no Samu. Atualmente, é coordenador do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência de Criciúma. Natural de Cachoeira do Sul (RS), ele é morador de Içara e além de atuar no Samu, também trabalha no Serviço de Atendimento e Resgate Aeromédico do Sul (Sarasul).
Ele conta que entrou na área da saúde por falta de opção. “A minha cidade natal é pequena, é interior e não tinha muitas opções para estudar, mas havia o curso de Técnico de Enfermagem e acabei fazendo. Me formei em 2003 e consegui uma bolsa 100% para estudar enfermagem em Criciúma. Cheguei no Sul de Santa Catarina em 2008 e comecei a trabalhar no Hospital São João Batista. Em seguida, abriu um processo para trabalhar no Samu, acabei passando e iniciando aqui”, relembra.
Há 15 anos trabalhando no Samu em diferentes cidades do Sul catarinense, o enfermeiro ressalta que o Samu evoluiu ao longo dos últimos anos. “Antigamente, não tínhamos muitas novidades no atendimento pré-hospitalar. Hoje, a gente já tem bastante estudo e muita gente interessada neste tipo de atendimento. Tivemos mudanças em relação aos protocolos de atendimento que pra nós era comum anteriormente. Atualmente temos algumas diretrizes que seguimos, o que acaba sendo padrão”, explica.
Domingues ressalta que não era o seu sonho de vida trabalhar com saúde, mas o destino mudou seus pensamentos e, hoje, ele se encontrou e é realizado. “Acabei me encontrando na saúde, é algo que eu gosto. Trabalhei em hospital, entretanto, o que me incomodava era trabalhar preso dentro de uma unidade. O Samu proporciona a gente estar na rua e vivenciar experiências diferentes”, comenta. “O Samu não tem rotina, não possui uma receita de bolo. Você escreve todo dia uma página nova, não vive coisas repetidas”, acrescenta.
Casado, o enfermeiro tem um filho de 4 anos. “Meu filho Mateus é pequeno, mas já entende sobre a viatura do Samu e até mesmo o helicóptero”, garante. O profissional de saúde ressalta que está no ápice de sua carreira, mas continua vendo evolução no Samu. “Vejo este serviço crescendo todos os dias. Daqui a pouco virão as motos e também ajudarão nos atendimentos e nas demandas”, completa.
Legenda: ambulâncias do Samu - Foto: Secom
“A gente escolheu estar aqui, os nossos pacientes não. As pessoas não escolheram ser atendidas por nós. Por isso, temos que dar o nosso melhor todos os dias. Este é o nosso serviço: é servir, é ajudar, é honrar esta farda”.
Magdiel Galvão Domingues, enfermeiro.
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Ocorrências marcantes
O enfermeiro destaca que as ocorrências trágicas, infelizmente, marcam mais, porém sempre quer lembrar dos atendimentos que tiveram êxito. “Às vezes a gente está aqui e quer uma ocorrência grave, só que no decorrer da sua profissão, você se torna mais maduro profissionalmente e percebe que isso não é bom. Gostamos da adrenalina, mas alguém vai estar mal por isso. Que sempre estejamos preparados para, se acaso acontecer, a gente possa atuar”, destaca. “Um atendimento que me marcou foi uma ocorrência em Balneário Rincão, um filho de um colega meu estava engasgado e conseguimos reverter, isso me marcou muito”, lembra.
Domingues afirma que o primeiro contato do profissional de saúde com o paciente é no atendimento. “Quando as pessoas ligam no telefone 192, elas não conversam com nós e, sim, com a regulação, com o médico e só nos repassam o que é o atendimento e endereço. Muitas vezes, as pessoas brigam conosco, acabam sendo grosseiras, mas em nenhum momento conversaram conosco antes, mas sim com outras pessoas”, explica.
Legenda: enfermeiro Magdiel Galvão Domingues está há 15 anos atuando no Samu - Foto: Rafaela Custódio/Portal Engeplus
Como coordenador do Samu, Domingues ressalta que preza pelo atendimento humanizado. “Peço e oriento meus funcionários para termos educação e cordialidade. Estamos em um local que ninguém quer estar, pois tem alguém precisando de ajuda, ou seja, um momento difícil. Se estamos lá, é porque alguma coisa aconteceu fora do normal. Então, sempre peço para que os profissionais tenham capacitação, educação e principalmente tenham um atendimento humanizado”, frisa.
Condutor socorrista - a realização de um sonho
Donny Fonseca Nunes, de 34 anos, é morador de Criciúma e atua como condutor socorrista. É ele quem conduz a ambulância e tem a missão de enfrentar o trânsito de Criciúma e buscar rotas mais rápidas para conseguir chegar a tempo para atender os pacientes. “Sempre admirava quando passava uma ambulância, independentemente se era do Samu ou do Corpo de Bombeiros. Ficava me questionando sobre como trabalhar com isso, pois sempre quis ajudar as pessoas. Foi aí que procurei um curso e me especializei no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) em condutor socorrista”, comenta.
Antes de atuar no Samu, Nunes trabalhou em diversas funções em supermercados, como cobrador de ônibus, e outros serviços. “Hoje, além de atuar no Samu, também faço parte do programa Bombeiro Comunitário. Já são quatro anos trabalhando no Samu. É um serviço que ajuda as pessoas e que todo mundo admira e elogia”, observa. “Minha função é levar a equipe até o local da ocorrência, o mais rápido possível e, claro, com segurança”, completa.
Trânsito e suas dificuldades
Ao ser o condutor da ambulância, Nunes enfrenta grandes dificuldades para trafegar em Criciúma. “Quando podemos, andamos no corredor do ônibus, mas nem sempre é possível. Quando estamos nos deslocando para atendimento precisamos de agilidade, de passagem e nem sempre é o que encontramos. Costumo dar o sinal de luz primeiro, mas mesmo assim é difícil e precisamos recorrer à sirene. Estamos lidando com vidas. Que essa matéria sirva de alerta para os motoristas de Criciúma e região, quando o Samu estiver pedindo passagem, seja gentil e dê. Não é brincadeira, é a vida de um ser humano que está em risco. Hoje, é de um estranho, amanhã pode ser de um parente”, reitera.
Conforme o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), as ambulâncias têm prioridade de trânsito e livre circulação. Isso está previsto no artigo 189 do CTB, Lei nº 9503 de 23 setembro de 1997, em que veículos de socorro como ambulâncias e carros de resgate possuem prioridade de passagem no trânsito, quando devidamente identificados e com alarme sonoro ligado.
Ocorrências chamadas
A reportagem do Portal Engeplus acompanhou o plantão dos profissionais das 7 às 19 horas, da última sexta-feira, dia 9 de fevereiro. A partir de agora, você acompanha como foi a rotina dos três trabalhadores citados acima.
Os três profissionais chegaram às 7 horas na base no bairro Próspera e registraram o ponto em um equipamento colado na parede. Logo em seguida informaram a Central de Regulação das Urgências (CRU) que estavam ‘ok’ para o serviço e logo foram acionados. A manhã ensolarada e quente em Criciúma foi tranquila, com apenas três atendimentos. Em um, Caru foi acionada pelo telefone, arrumou sua farda, chamou Nunes e em menos de 30 segundos deixaram a base.
A informação da CRU foi apenas uma: ‘bebê de três meses que caiu do carrinho e bateu a cabeça em Criciúma’. A dupla se deslocou ao endereço, atenderam o bebê e o encaminharam ao Hospital Materno Infantil Santa Catarina (HMISC). Na chegada da dupla na base foram questionados sobre a ocorrência pelo coordenador Domingues:
- Como foi a ocorrência?
- Bebê caiu do carrinho, bateu com a cabeça e levamos para o HMISC, mas aparentemente tudo bem. (Caru).
A manhã tranquila no posto trouxe também momentos de aflição e os profissionais falaram sobre a falta de atendimento.
- Sexta-feira de carnaval e está tudo parado, está um dia atípico. (Caru)
- Pode ser que a noite esteja mais corrido, vamos ver as próximas horas. (Domingues).
Os três profissionais optaram por almoçar por volta do meio-dia. Caru foi a primeira a falar em comida e logo pediu duas marmitas, sendo para ela e ao seu colega Nunes. Já o enfermeiro Domingues trouxe seu almoço de casa.
Almoçaram rápido porque não sabiam se teriam ocorrências nos próximos minutos. Comeram, limparam a mesa, lavaram seu talheres e descansaram alguns minutos, quando o telefone tocou e Caru logo chamou Nunes para a primeira ocorrência à tarde, por volta das 12h30.
- Vamos, Nunes. Temos atendimento de um idoso de 85 anos.
Os dois saíram novamente em menos de 30 segundos do posto, avançaram para a avenida Centenário e com os recortes da revitalização da via, tiveram dificuldades com o trânsito, mas chegaram ao destino em minutos e um homem já esperava no portão. Ambos desceram com a mochila vermelha levando os equipamentos necessários. Minutos depois, Nunes retornou para a ambulância, pegou a maca e levou para dentro de casa. Instantes depois retornou já com o idoso.
Arte: Portal Engeplus
Dentro da ambulância, Caru conversou com o médico na CRU, passou detalhes do atendimento e o paciente foi encaminhado ao Hospital São José.
Após a saída do Hospital São José, os dois tentaram voltar para a base, mas durante o trajeto foram novamente acionados. Desta vez, no bairro Comerciário.
- Atendimento em escola, deve ser professora, não está tendo aula. (Caru)
- Ok, vamos. (Nunes)
Nunes trafegou pela pista destinada ao ônibus municipal e em poucos minutos chegaram ao colégio. Uma professora havia passado mal devido ao calor que fazia em Criciúma. Ela foi retirada da unidade escolar de maca e, na ambulância, os profissionais conversaram.
- Muito calor naquela sala de aula, a pressão subiu. (Caru)
- O doutor disse para encaminhar para a UPA da Próspera. (Caru)
- Ok. (Nunes)
Os dois se deslocaram para a UPA da Próspera, deixaram a paciente e Caru informou a CRU que já estava disponível novamente para atendimentos e foi chamada para uma ocorrência no bairro Mina Brasil.
- Idosa caiu e cortou a cabeça. (Caru)
- Ok, coloca o endereço no mapa. (Nunes)
Eles seguiram para o destino, mas quando estavam chegando ao endereço encontraram familiares da vítima. Eles informaram que estavam levando a idosa por meios próprios. A ocorrência foi finalizada.
A dupla não teve muito tempo para respirar quando novamente a CRU acionou novamente. Desta vez, a ambulância do Rio Maina estava em atendimento, com isso, precisaram se deslocar para o distrito e atender uma idosa.
Legenda: Carulini Francisco Barbosa registrando dados dos pacientes - Foto: Rafaela Custódio/Portal Engeplus
Ao chegar no endereço, Nunes precisou manobrar a ambulância, entrou em pátio com grama e em seguida trouxe a idosa na maca. Ela havia tido febre e era acamada, e a dupla a levou para a UPA do Rio Maina após conversa com o médico da CRU.
Os dois atuaram nesses ocorrências durante toda a tarde e só retornaram para a base no bairro Próspera por volta das 17 horas.
- Preciso tomar água, está muito calor. (Caru)
Assim que ambos entraram na base, tomaram água e Caru foi logo para o computador para preencher suas fichas de atendimento. Eles ainda tiveram outras situações de atendimento e em seguida, abasteceram a ambulância e entregaram o plantão com sete ocorrências atendidas.
Caru depois de 24 horas voltou para casa. Nunes se despediu dos colegas e também retornou ao aconchego do lar, assim como o coordenador do Samu. O plantão dos três profissionais chegou ao fim e uma nova equipe assumiu a função.
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